distribuidores nacionais
Infor Channel
perguntou aos distribuidores de capital nacional como estão enfrentando e superando os efeitos da pandemia, que se somam ao já desafiador cenário brasileiro
Por Marcelo Gimenes Vieira
Se há uma certeza sobre o que ainda virá em 2020 para o mercado de TI – global e local – é a de que não será fácil. Apesar da sempre válida lógica de que a tecnologia pode ajudar o mercado corporativo a atravessar dificuldades como as impostas pela pandemia de Covid-19, desta vez, pode não ser o suficiente. É o que indicam os estudos que tentam traçar um cenário futuro, e que até aqui preveem quedas consideráveis nas vendas – o impacto sobre os distribuidores também deve ser severo.
O Gartner, por exemplo, prevê que os gastos mundiais com TI em 2020 vão cair 8% devido à pandemia. E que metade (51%) dos executivos de finanças no mundo estão se preparando para quedas médias de 30% no faturamento das empresas, provocando redução em investimentos, inclusive em tecnologia. As vendas de smartphones devem cair 20,2% e a de PCs (desktops e notebooks), 10,5%, para mencionar apenas dois itens.
No Brasil a previsão não é diferente. Para a IDC, o mercado de TI do País deve registrar queda de 1% em 2020, enquanto na América Latina pode chegar a 3,7%. No segundo trimestre, conforme o levantamento, 42% das empresas devem gastar menos com TI do que o previsto no começo do ano, antes da pandemia.
Para os distribuidores nacionais, além das perspectivas ruins há o cenário brasileiro, historicamente complexo. Um indicativo é o estudo feito pela consultoria IT Data Inteligência de Mercado, a pedido da Associação Brasileira de Distribuição de Tecnologia da Informação, a Abradisti. O levantamento mostra que entre as cerca de 400 revendas de TI ouvidas no começo de junho deste ano, 75% dos integradores e revendas de valor agregado - VARs, esperam queda de faturamento, e 20% consideram fechar. Entre as revendas de volume o cenário é ainda mais dramático: 85% esperam queda e 30% o fechamento.
Busca de soluções
“É realmente um momento delicado”, lamenta Marcos Renato Di Lorenzo, diretor de Canais e Novos Negócios da Officer. “Com certeza revendedores de vários perfis, de volume e de valor, estão muito preocupados. Se demorar muito para passar essa fase mais complicada da economia, muitas não reabrirão as portas”, avalia.
Com a instabilidade cambial, a oferta como serviço em moeda local permite saber o valor de cada parcela
O primeiro grande sinal de dificuldades por parte das revendas e que impacta diretamente os distribuidores é o aumento dos pedidos de prorrogação de pagamento. Além da Officer, vários dos entrevistados por Infor Channel relataram a necessidade crescente de conceder mais crédito às revendas por meio de renegociação de dívidas, o que afeta o fluxo de caixa e aumenta a necessidade de captação por parte dos distribuidores.
“Estamos trabalhando em algumas frentes para capitalizar a empresa, mas o acesso ao dinheiro do governo não está fácil”, reclama Lorenzo.
Outro impacto sentido pelos distribuidores nacionais é a dificuldade de importação, principalmente de produtos vindos da China. A IData, distribuidora paranaense que atua no segmento enterprise, tem experimentado problemas na hora de trazer produtos do país asiático. A demanda por equipamentos médicos e relativos ao combate à pandemia tomou de assalto os espaços nos aviões, e o valor do frete triplicou.
“Não trabalhamos com [transporte] marítimo, porque não tenho volume cúbico para isso. Às vezes trago da China componentes de fabricantes que não estão no Brasil, e hoje não há voos”, explica Milton Caputo Júnior, fundador e CEO da companhia.
O executivo acredita que, embora vá de fato haver uma crise nos próximos meses, o mercado de TI brasileiro sofrerá menor impacto. Entre as revendas, as que mais sofrerão são as menores e mais jovens, que passaram por “dois meses muito cruéis” devido ao pouco capital de reserva para suportar a recente e drástica redução da demanda. Mas há alternativas.
A maioria das empresas está se preparando para manter permanentemente pelo menos parte dos funcionários em trabalho remoto. “É como um cara que ocupa um prédio de 20 andares, de repente, descobre que não precisa mais pagar tanto aluguel. Quem acreditava que teria problemas com o home office, agora continua crescendo, mesmo na crise”, reflete a respeito dos clientes. “Mas vai ter retração? Vai, claro.”
A IData também tem renegociado dívidas e aumentado prazos de pagamentos para parceiros em dificuldades.
Blindagem contra a crise
Entre os distribuidores brasileiros ouvidos pela reportagem, os que parecem ter sentido menos o impacto da crise são aqueles que, nos últimos anos, ampliaram a oferta de serviços. A ApliDigital, por exemplo, distribuidor focado em Segurança da Informação, obteve bons resultados durante os meses do isolamento social graças à oferta de serviços e ao portfólio aderente ao momento dos clientes.
“Obviamente ninguém esperava que isso acontecesse. Fomos todos abruptamente surpreendidos”, comenta Sandro Sabag, CEO da distribuidora. “O que nós que atuamos com soluções de Segurança da Informação oferecemos é o que empresas de qualquer tamanho precisam para fazer trabalho remoto de forma confiável.”
Virtual Private Network - VPNs, segurança de e-mail, monitoramento e acesso remoto, proteção para aplicações Web são alguns exemplos. A ApliDigital percebeu um aumento substancial da demanda principalmente pelo e-commerce, que dobrou de tamanho em dois meses e meio, segundo Sabag.
É preciso estar bem assessorado sobre alíquotas e convênios para não pagar impostos além do devido
A oferta de soluções como serviço às revendas é feita pela empresa desde 2014, por meio da divisão chamada Content, que cresceu principalmente nos últimos dois anos. Para o executivo, os serviços oferecem grandes vantagens em momentos de instabilidade, e são uma tendência de consumo. Eles respondem por cerca de 20% da receita do negócio atualmente, e crescem em média 20% por trimestre.
Com a instabilidade cambial, a oferta como serviço em moeda local permite que o cliente saiba quanto vai pagar em cada parcela. “É um enorme facilitador, tanto para o cliente como para o revendedor, que vai fazer uma oferta mais precisa”, diz.
É a mesma lógica que poupou de impactos a EsyWorld, distribuidor paulistano especialista em soluções de Segurança da Informação e, também, física. O deslocamento de grandes contingentes de trabalhadores dos escritórios para o teletrabalho levou os clientes a investirem em proteção.
“Não sentimos impacto ainda, mas nos preocupamos conforme a crise vai se estendendo. O mercado como um todo vai afetando nosso cliente, e ele vai parar de comprar? Há risco de inadimplência no futuro”, ressalta Rogério Moraes, sócio e CEO da EsyWorld. Além de oferecer soluções como serviço, a empresa também presta apoio na pré-venda aos parceiros de canal. Oferece ainda serviços profissionais, cedendo técnicos para projetos específicos.
A WDC Networks também está conseguindo contornar, e muito bem, a crise com base no pilar de serviços. Desde 2013 oferta tecnologia como serviço, modelo de negócios que a levou a registrar o “melhor mês da história” em maio.
“As empresas diminuíram investimentos e o budget para aquisição de tecnologia foi reduzido, mas as necessidades continuam existindo”, diz Júnior Carrara, diretor de Vendas e Marketing da empresa. “O cliente final não tem que pagar milhões de uma vez em Cibersegurança; ele paga em 60 meses, via revenda. Muito do nosso recorde de vendas se explica por esse modelo”, explica.
A tendência é aumentar a proporção do faturamento da WDC que vem de serviços. “O que começou com 5% da receita em 2017 e chegou a 35% em 2019, em 2020 certamente vai passar de 40%”, aposta. “O momento Brasil e da pandemia está pedindo isso”, pondera Carrara.
As várias áreas de atuação vertical da WDC foram impactadas de formas distintas. No mercado de áudio e vídeo profissional, a receita despencou 60%, enquanto no que se refere a soluções para Provedores Regionais de Internet – ISPs, disparou em função do aumento da demanda dos consumidores.
Desafios históricos
Como se não fossem suficientes, as dificuldades impostas pela pandemia se acumularam àquelas diariamente enfrentadas pelos distribuidores e revendas: carga tributária elevada, burocracia excessiva, dificuldades de importação, entre outros. Soma-se a isso as expressivas flutuações do câmbio registradas este ano – o Dólar se valorizou quase 30% frente ao Real apenas no primeiro trimestre de 2020.
O Brasil é muito complexo e o negócio de distribuição começa com a compra no exterior, com fabricantes em sua maioria asiáticos ou estadunidenses. “Não importa se tem hardware envolvido ou só licenciamento, a complexidade é sempre muito grande”, pondera Sandro Sabag, da ApliDigital. “O conhecimento da operação é fundamental, porque é sempre muito arriscado fazer alguma coisa.”
Na avaliação geral, a questão tributária é provavelmente a mais difícil de ser enfrentada, principalmente nos impostos entre as Unidades Federativas. “São 27 Estados, cada um com suas características”, ilustra Sabag, que salienta a necessidade de se estar sempre muito bem assessorado a respeito de alíquotas e convênios para não acabar pagando impostos além do devido.
“O negócio de distribuição não é de compra e venda, é tributário”, ironiza Lorenzo, da Officer. “A diferença entre ganhar e perder dinheiro está nos benefícios que se consegue. Vendemos no Brasil todo, e cada Estado tem suas regras. Isso impacta muito nosso dia a dia e precisamos estar muito atentos.”
Para lidar com o problema, a Officer – a exemplo de vários distribuidores nacionais – aposta na manutenção de depósitos em localidades consideradas chave. São Paulo e Espírito Santo foram as opções da empresa, considerando benefícios concedidos e simplificações de obrigações como a substituição tributária do ICMS, por exemplo.
A desvalorização recente do Real, motivada agora pela pandemia, mas recorrente no cenário nacional, é a cereja do bolo. Para empresas que na maioria das vezes atuam como importadores de equipamentos ou componentes, a flutuação repentina pode ser a diferença entre o cancelamento ou manutenção de um projeto por parte do cliente final.
“Atuamos com 90% de equipamentos importados. Essas sazonalidades de câmbio geradas por instabilidades, agora por conta da Covid-19, mas também por conta de rumores de saída de ministros, impeachment etc, atrapalham muito”, diz Carrara, da WDC, cuja principal estratégia nos casos de clientes que precisam de valores fixos em Reais é o chamado hedge cambial.
O hedge, também conhecido como operação de cobertura, é um mecanismo de proteção contra oscilações cambiais. O objetivo é cobrir transações realizadas em períodos de variação em cotações. São geralmente negociados no Mercado Futuro, ou seja, com base em estimativas e contratados de instituições financeiras, o que significa custos invariavelmente passados para o consumidor.
“Isso tem se tornado cada vez mais comum nos últimos meses. O cliente final acaba pagando a conta e não há muito o que fazer”, conta Carrara.
Sabag concorda, e diz que atualmente é difícil prescindir dessas proteções de mercado, principalmente em grandes projetos. “Um distribuidor global tem outra percepção, mas os brasileiros precisam contar com essas ferramentas”, compara o CEO da ApliDigital, uma empresa nacional.
Competir com gigantes
Enfrentar as empresas multinacionais de distribuição é um desafio adicional. Afinal, são companhias gigantescas, capazes de suportar períodos prolongados de crise e de captar recursos no exterior a custos menores. Essa solidez e facilidade de mobilizar capital são apontadas quase unanimemente como vantagens pelos concorrentes nacionais. Mas eles também têm fragilidades.
Especialização traz mais proximidade com o canal, além de conhecimento técnico
“Compensamos isso com esforços”, diz Rogério Moraes, da EsyWorld. “Conhecemos melhor o mercado, as regiões e nos adequamos melhor. Entendemos as peculiaridades do Brasil, e quem vem de fora não faz ideia de como funciona nossa tributação.”
Outro ponto positivo é o foco que distribuidores menores são capazes de dar a determinados nichos de produtos. A EsyWorld, por exemplo, focada em segurança, oferece produtos de um número reduzido de fabricantes. Essa especialização traz, primeiro, mais proximidade com os revendedores, e depois mais conhecimento técnico das soluções.
“Trabalhamos para garantir que o parceiro ofereça corretamente a solução para o cliente certo. É uma venda consultiva, em que a revenda precisa saber qual o problema do cliente para não vender algo que não o atenda”, lembra.
A IData, que concentra esforços no segmento de enterprises, adota estratégia semelhante. A distribuidora é de nicho e trabalha exclusivamente com servidores, armazenamento e infraestrutura de rede, entre outros itens. Trata-se de um segmento que passa por uma fase intensa de consolidação, conforme emergem os modelos de negócio baseados em serviços, mas que tem sido bem explorado pela empresa de Curitiba. “Duplicamos o número de revendas ativas em 2019, quando registramos um crescimento de 27%”, salienta Caputo Júnior.
Nessa forma de atuar, a proximidade entre revendas, integradores, provedores de serviços e o distribuidor, faz toda a diferença, especialmente na hora de executar projetos e prestar suporte. Lorenzo, da Officer, lembra outra vantagem importante dos nacionais: flexibilidade e a agilidade para tomada de decisões.
“Às vezes um distribuidor multinacional exige conferências e explicações. Os gestores brasileiros precisam explicar e reportar tudo para o pessoal lá fora, e isso causa demora e impacta a tomada de decisões”, pondera ![Image](assets/images/item_52768.png)